quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Desencontros

     Em certa ocasião social, estava eu em uma reunião amigável de conhecidos em um restaurante. Muitas conversas, muitos assuntos, muitas opiniões, piadas, risadas, enfim, um ambiente de descontração. Em determinado momento ouvi de uma pessoa um comentário sobre mim, nada de mais, nada de menos, um comentário despreocupado e despretensioso. De súbito me veio a resposta certa ao tal comentário, em instantes construi na mente todo um argumento que definiria minha postura, minha opinião sobre mim mesmo, que reflete minha opinião sobre todas as outras coisas, quem sou eu, o que é o mundo para mim e em mim. Porém, estranhamente, palavras de minha boca não saíram, a opinião se reteve em pensamento, e no fluxo da conversa  a idéia se perdeu na memória das coisas não feitas. Não me expressei por minhas palavras, mas sim por meu silêncio. Mas algo em mim clamou por expressão, algo em mim queria se retratar, mas não o fez. Tudo se deu despercebidamente aos olhos dos que me viam, mas em minha alma algo ressoou fundo, algo invocou minha atenção filosófica, minha consciência  concentrou-se.
    Me desconcertei, me desencontrei comigo mesmo, me atrapalhei entre o que sou, o que penso que sou e o que desejo ser. Esbarrei desajeitado na alteridade de mim mesmo. E o vazio que ocupa meu Ser se revelou imenso como o não-Ser, ou como o porvir. E mesmo sendo tantos, ainda não há tantos que me ocupem por inteiro. Algo sempre sobra, algo sempre falta. O espaço não cartesiano da intimidade se expande, se dilata, se amplia, me tornando pequeno, me tornando vazio, abrindo em meu peito clareiras e desertos, onde ainda tenho de semear flores  se quiser criar jardins.
    Qual é afinal a distancia que separa um Ser dele mesmo? Como medir o espaço metafísico  entre a sensação, o pensamento e a ação? Sou um conjunto desconjuntado de sensações e pensamentos desconexos, de ações feitas e não feitas, de lembranças e imaginações, de mentiras e falácias em meio a verdades inventadas. Do espaço vago de mim mesmo surge a Angústia, sina macabra dos homens, abismo sinistro no âmago da existência. O que realmente sou, sem o saber, é leve como uma pluma, e passara simples e efêmero como a vida das plantas, mesmo sem eu me dar conta. O que almejo ser, isso sim pesa toneladas de esperança vã e torturante. Queria não mais esperar. Queria simplesmente abraçar o Tempo e destruir a distinção entre mim e meus  outros Eus.

 

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