O encontro inesperado causou surpresa e espanto, mesmo disfarçado
por de trás de um ar cotidiano de banalidade. Eles se cruzaram na
saída de um prédio comercial no centro da cidade em meio aos
transeuntes indiferentes. Ambos de cabeça baixa, imersos em suas
particularidades quase não viram um ao outro, e se viram, não foi
por atenção, mas por intuição. Em um leve movimento do
olhar, em um único instante efêmero de casualidade do destino, se
encararam, assim meio de lado, no ato continuo da passagem, como
algo que se lembra e se esquece. A cena foi um tanto constrangedora,
cumprimentaram-se friamente, trocando sorrisos tímidos e
dissimulados, e continuaram seus caminhos opostos em busca da mesma
coisa, mas não sem antes vacilar, cheios de dúvidas e temor. Já
distantes, separados pelo abismo das escolhas; ela parou na esquina
sem se virar, e esperou alguns minutos pelo improvável, antes de
partir definitivamente. Ele diminuiu o passo e se virou, buscando
inutilmente a imagem dela na multidão. Faltou coragem, sussurra uma voz...
Esse amor que é
silêncio e sombra, sempre presente e passageiro, tal como um déjà
vu. De tão delicado, beira a não existência, constituído
de restos de memória, desejos imperfeitos, poemas antigos e
filmes em preto e branco, de paisagens marítimas vastas e vazias de um norte qualquer. Idealizado na ausência há flertar
paradoxalmente com a solidão.