quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Estética do observador




De minha quase que natural inclinação a solidão, associada a minha vivência urbana, típica das metrópoles cosmopolitas do mundo contemporâneo, acabei por desenvolver um alto grau de singularidade frente a sociedade que me rodeia. Sou só mais um transeunte anônimo caminhando pelas ruas da cidade, pelas praças, dentro dos ônibus e metros. E tudo que meus sentidos captam do mundo externo e automaticamente interiorizado e peculiarmente tornado meu, tornado eu. Tenho livre acesso as mais modernas e tecnológicas fontes de informação, que derramam por sobre meus olhos e ouvidos quase todo o conhecimento já produzido pela humanidade por séculos e séculos, e isso só depende de um simples movimento do meu dedo indicador por sobre o mouse. Voraz consumidor de saber, bebo conhecimentos de todos os tipos, de filosofia grega a bossa nova, de fenomenologia a geopolítica, de cinema novo a surrealismo...
A contradição disso tudo é que dentro de toda essa multiplicidade do mundo pós-moderno acabei por me torna incapaz dos mais simples exercícios de sociabilização. Praticamente um eremita na cidade! Tudo fora de mim parece estranho e hostil, já não sinto intimidade com nada. Participo dos mais diversas culturas e subculturas contemporâneas, mas não pertenço a nenhuma. Eterno estrangeiro de todos os lugares! Ando em meio as multidões, mas estou sempre só. Olho para as pessoas e sei que são humanas como eu, e ainda assim pareço pertencer a uma raça única e já extinta. E é daí que surge o que chamo de estética do observador.
Da janela de meus olhos observo o mundo lá fora. Ele é vasto e diverso, sem começo nem fim, sem centros ou mesmo periferias, caótico e extremamente organizado, sublime e apavorante! Um macro sistema global formado por inúmeros micro sistemas locais. Um enorme emaranhado de culturas tão iguais quanto diferentes. Em suma um enorme caldeirão de relações de poder, impossível de ser analisada como um todo por indivíduos que são só seus fragmentos, e por tanto só podem dar conta de analisar fragmentos. Querer mais do que isso é como pedir a uma formiga que explique o que é um continente.
Como já não tenho pretensões de entender a existência como se ela fosse totalmente inteligível e o racionalismo cartesiano me parece banal, me contento em apreciar o quanto posso ver e sentir do mundo e o quanto posso particularizar isso como meu mundo. Aprecia-lo como se dele não fizesse parte, como mero observador, como um voyeur da vida. Olhar para o mundo como se uma película fina, porém intransponível me separasse dele. Assim tudo se torna belo e contemplativo, até mesmo os horrores humanos, pois no fundo tudo se resume a estética, a como percebemos as coisas, todas as ideologias, filosofias e religiões não passam de estética. A sociedade é uma grande farsa, um teatro de máscaras, um filme sem fim onde sou o único expectado do lado de fora da tela, que na verdade é meu lado de dentro. Minha ânsia de mudar o mundo tende a se apaziguar, pois já percebi que o mundo não precisa de mim para muda-lo, ele faz isso naturalmente. E a mim, cabe apenas notar essas modificações e quem sabe escrever algo sobre elas como puro exercício de estética...
Obs: Estética é normalmente definida como o estudo do belo. Mas prefiro adaptar essa definição para o estudo das formas de percepção do belo.

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